Comportamento inédito de orcas é registrado na Noruega
03/07/2025, 19:45:02
Um registro inédito na Noruega
Em um registro inédito feito no norte da Noruega, um par de orcas selvagens foi filmado protagonizando um comportamento nunca antes documentado em seu habitat natural: um \"beijo de língua\". A cena, que durou aproximadamente dois minutos, mostra uma interação oral delicada e contínua entre os cetáceos, posicionados frente a frente, antes de se afastarem e seguirem por caminhos opostos.
Primeira evidência científica deste comportamento
De acordo com o Phys.org, o estudo publicado recentemente na revista Oceans, destaca que esta é a primeira evidência científica desse comportamento em orcas em liberdade. \"Este estudo apresenta a primeira observação registrada de mordidas de língua entre duas orcas selvagens\", escrevem os autores. Embora esse tipo de contato já tenha sido observado em cativeiro desde a década de 1970, os cientistas nunca haviam testemunhado algo semelhante em ambientes naturais.
Relação social e conservação
Em entrevista concedida ao Portal iG, Juliana Assis, bióloga marinha do Projeto Lagoa Viva, destacou a relevância do comportamento inédito registrado entre as orcas selvagens na Noruega — o chamado \"roer a língua\", também conhecido como tongue nibbling. A interação foi descrita como um gesto voltado à construção e ao fortalecimento de vínculos sociais, especialmente entre jovens indivíduos.
\"O comportamento de 'roer a língua' entre orcas é visto como um ato afiliativo, ligado à motivação dos animais para estabelecer e manter laços sociais e sentir-se parte de um grupo, sobretudo entre os juvenis\", explicou a especialista. Esta é a primeira vez que se observa o ocorrido entre orcas selvagens, o que amplia a compreensão sobre sua complexidade social.
Compreensão da complexidade social
Apesar de possuírem estrutura óssea voltada para a caça, as orcas demonstraram controle oral refinado durante o comportamento. \"A ausência de sinais de agressão ou dominância sugere que, embora a mandíbula e os dentes sejam poderosos, as orcas são capazes de exercer controle preciso sobre seus movimentos orais para fins sociais\", diz Juliana Assis.
Para Patrícia Farias, bióloga marinha e mestre e doutoranda em dinâmica dos oceanos e da Terra pela UFF, \"esse registro mostra que ainda há muito a ser estudado pelos pesquisadores, conhecemos apenas uma fração do repertório social e emocional das orcas selvagens. As orcas possuem dialetos e hábitos próprios e exibem aprendizado social complexo. Este gesto \"deliciado\" registrado mostra que existe sutileza entre suas interações em grupo e mostra que não podemos reduzi-las apenas a caçadoras brutais e há muito a ser estudado e descoberto entre estes seres fascinantes\", afirmou ao iG.
Novas tecnologias e ciência cidadã
Ambas as biólogas destacam que a principal ferramenta para compreender o padrão social das orcas continua sendo a observação do comportamento animal em seu habitat natural. Para isso, o uso de câmeras de ação subaquáticas, acopladas a drones ou veículos autônomos, pode ser fundamental na documentação de interações sutis entre os cetáceos. A ciência cidadã, que já teve papel crucial ao registrar esse comportamento de forma oportunista, também deve ser incorporada como aliada nesse processo.
Elas alertam ainda para a importância de regulamentar rigidamente as atividades de turismo marinho, evitando interferências negativas na vida dos animais e garantindo condições adequadas para a pesquisa comportamental. Além disso, populações de orcas sob cuidados humanos continuam sendo úteis como modelos de estudo, permitindo a observação de dinâmicas sociais em ambientes controlados — especialmente quando certos comportamentos são difíceis de registrar na natureza.
Impactos para a conservação
O registro inédito, apesar de inusitado, acaba por reforçar uma crítica importante sobre políticas de conservação, especialmente para orcas mantidas em ambientes artificiais como cativeiros e tanques que limitam drasticamente as possibilidades de expressões sociais complexas. Para as pesquisadoras, a descoberta serve como argumento sólido em defesa de práticas de bem-estar mais rigorosas, que garantam às orcas espaços e condições adequadas para manter interações sociais naturais.
\"Esses animais são extremamente complexos, com vínculos emocionais e comportamentos ricos em significado social. Compreendê-los é essencial para fortalecer políticas de conservação e proteger as populações selvagens em seus próprios habitats\", conclui Patrícia Farias.