Duas campanhas com cheiro de uma: governo e senado
19/11/2025, 07:26:12Quando duas disputas caminham no mesmo passo e revelam um único projeto de poder
Há momentos na política em que o calendário eleitoral finge separar disputas, mas a realidade as une, costurando bastidores, interesses e projetos pessoais numa mesma tapeçaria. O que estamos vendo agora é exatamente isso: duas campanhas que deveriam ser paralelas — governo e Senado — começam a exalar o mesmo perfume, dividir os mesmos cabos eleitorais, compartilhar os mesmos movimentos e revelar que, no fundo, são apenas duas faces de um único projeto de poder.
A disputa pelo governo naturalmente arrasta consigo as ambições de quem mira o Senado. E, inversamente, uma candidatura ao Senado que se fortalece pode redesenhar palanques, alianças e até decisões sobre quem terá coragem — ou não — de entrar no jogo majoritário. Quando essas duas correntes se encontram, o cenário passa a ser menos “eleição” e mais “engenharia política”.
No atual contexto, as movimentações são quase siamesas: reuniões que deveriam discutir uma frente acabam tratando da outra; alianças que parecem pensadas para 2026 surgem, misteriosamente, moldadas para garantir espaço e sobrevivência; e promessas que soam estaduais já nascem calibradas para não ferir acordos federais. Isso tudo revela que, por trás das placas de campanha, existe apenas um grande projeto sendo dividido em dois blocos — um para a cadeira do governo, outro para a tão cobiçada vaga no Senado.
Esse cheiro de campanha única não nasce à toa. Ele brota da necessidade de sobrevivência política, da leitura estratégica dos grupos e, claro, de uma classe que sabe que eleição é mais sobre caminho do que sobre destino. E nesse jogo, ninguém quer caminhar sozinho. O risco é grande demais, especialmente quando o eleitor está mais exigente, a rede social mais vigilante e o ambiente político mais volátil.
O curioso é que, enquanto as campanhas se misturam, os discursos tentam separar. Para o eleitor, vão vender autonomia, projetos próprios, identidades distintas. Mas nos corredores que realmente decidem, o roteiro é feito a quatro mãos: quem ajuda a subir no governo recebe promessa para o Senado; quem puxa voto para o Senado ganha abrigo no governo. É a velha política do “ganha junto”, com nova maquiagem, mas com o mesmo DNA.
No fim, o eleitor perceberá — como sempre percebe — que a disputa pode ter dois nomes, duas urnas, duas composições… mas carrega uma só lógica: a de que ninguém quer perder poder, e de que o futuro político de dois grupos diferentes depende da vitória simultânea de ambas as frentes. Por isso andam juntas, respiram juntas, calculam juntas e até tropeçam juntas.
Duas campanhas com cheiro de uma. E esse cheiro, goste-se ou não, anuncia que 2026 será decidido menos pelo confronto de projetos e mais pela habilidade dos grupos em manter unido aquilo que fingem estar separado. política é assim: às vezes a unidade está justamente na divisão.