Prestador de serviços deve manter-se dentro da étia e da ordem

Quando uma ONG vira pasta familiar, alguma coisa de errado tem...

Prestador de serviços deve manter-se dentro da étia e da ordem

Em qualquer sociedade que se pretenda minimamente justa, a relação entre servidor público e população deveria ser pautada por equilíbrio, transparência e compromisso. No entanto, o que se vê em muitos municípios brasileiros é a reprodução de um modelo perverso: o gestor de ONGS que devolve ao povo 20% em serviços e benefícios, enquanto transforma os outros 80% em capital político, favores privados ou ganhos pessoais. Essa lógica de “prestação” desigual — onde a comunidade recebe migalhas e a classe "política" colhe lucros — é, na prática, uma forma moderna de furto institucionalizado.

Essa dinâmica não é fruto do acaso. É a construção lenta e calculada de um estilo de governar que confunde serviço público com patrimônio particular. Quando uma ONG pacientes ou deficientes como se fosse de graça, entrega um benefício apenas ao grupo aliado ou manipula atendimentos para favorecer sua imagem pessoal ou familiar, está fazendo mais do que administrar: está usando a máquina pública como extensão de seu grupo familiar. O povo recebe o mínimo, o gestor leva o máximo — e, ainda por cima, apresenta tudo como se fosse uma grande benfeitoria. É o velho “rouba, mas faz” disfarçado em publicidade oficial.

O problema se agrava porque essa distorção cria uma relação viciada entre povo e prestador de serviços. Em vez de políticas públicas universais, surgem trocas de favores. Em vez de direitos, surgem dependências. O povo fica condicionado a agradecer por aquilo que já é seu por lei, enquanto o gestor - presidente da ONG, posa de salvador. Quando uma administração opera assim, tomando 80% da pauta — visibilidade, controle, narrativa, dividendos políticos — e devolvendo apenas 20% em ações concretas, ela não está governando: está apropriando-se do que pertence à coletividade.

Dizer que isso é furto não é exagero retórico; é constatação moral. O desvio pode não ser sempre financeiro, mas é profundamente ético. Rouba-se a dignidade da população, o direito à cidadania plena, a expectativa de igualdade e, principalmente, o valor humano. Um administrador comprometido de verdade deveria inverter essa proporção: 80% ao povo, 20% ao gestor — e, desses 20%, apenas na forma de reconhecimento público e legitimidade democrática. Até que isso aconteça, a sociedade continuará sendo vítima desse assalto silencioso, praticado à luz do dia, com selo oficial e assinatura de quem jurou servir, mas prefere lucrar.

Creditos: Professor Raul Rodrigues