Evento Carrington e os Riscos de Tempestades Solares Hoje
15/12/2025, 22:06:13O Evento Carrington e Sua Importância
O chamado Evento Carrington, ocorrido em 1859, é considerado até hoje o maior registro de tempestade solar da história. Mais de 160 anos depois, o fenômeno voltou ao centro das discussões científicas diante do aumento da atividade solar e da crescente dependência da sociedade moderna de sistemas tecnológicos sensíveis ao chamado clima espacial.
Segundo o pesquisador Luis Eduardo Antunes Vieira, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), tempestades solares são um conjunto de fenômenos que se originam na atmosfera do Sol, propagam-se pelo espaço interplanetário e podem interagir diretamente com a atmosfera da Terra e seus sistemas tecnológicos.
“Esses eventos estão ligados à evolução do campo magnético solar e seguem um ciclo aproximado de 11 anos, conhecido como ciclo solar”, explica Vieira, que é pesquisador titular da Divisão de Heliofísica e Ciências Planetárias do INPE e principal investigador da missão Galileo Solar Space Telescope (GSST).
O Que Foi o Evento Carrington
O Evento Carrington recebeu esse nome em referência ao astrônomo britânico Richard Carrington, que observou, em 1º de setembro de 1859, uma intensa explosão solar. Horas depois, a Terra foi atingida por uma poderosa ejeção de massa coronal, desencadeando uma tempestade geomagnética sem precedentes.
Na época, sistemas de telégrafo entraram em colapso, operadores receberam choques elétricos e auroras foram vistas em regiões incomuns, como o Caribe e partes da América do Sul.
O episódio ocorreu em um período em que a sociedade ainda não dependia de satélites, internet ou redes elétricas complexas, o que, segundo os cientistas, reduziu os danos registrados.
Consequências de um Evento Solar Extremo
De acordo com Vieira, eventos solares extremos envolvem três processos principais:
- Emissão intensa de radiação eletromagnética;
- Aceleração de partículas a altas energias;
- Ejeção de grandes quantidades de plasma solar.
Para comparação, o vento solar típico tem velocidade média entre 300 e 400 km/s, enquanto ejeções extremas podem ultrapassar 1.000 km/s, chegando em casos raros a 2.000 km/s.
Possíveis Impactos em Tempos Modernos
Caso um evento da mesma magnitude ocorresse nos dias atuais, os impactos poderiam ser severos. Estudos da NASA, da NOAA (Administração Oceânica e Atmosférica dos EUA) e da Agência Espacial Europeia (ESA) indicam riscos elevados para:
- Redes de transmissão de energia elétrica;
- Satélites de comunicação, navegação e meteorologia;
- Sistemas de GPS;
- Aviação comercial, especialmente em rotas polares;
- Internet e telefonia móvel.
Vieira destaca que até eventos solares moderados já causam prejuízos relevantes. Um exemplo ocorreu em fevereiro de 2022, quando uma tempestade solar levou à perda de 38 dos 49 satélites Starlink recém-lançados, devido ao aumento do arrasto atmosférico causado pela expansão da alta atmosfera terrestre.
Preparação do Brasil para Supertempestades Solares
Embora a previsão precisa desses eventos ainda seja um desafio científico, há um esforço internacional contínuo para monitorar o ambiente Sol–Terra. Organizações como a NOAA, a NASA, a ESA e observatórios solares espalhados pelo mundo acompanham em tempo real a atividade solar.
No Brasil, o INPE é a principal referência nacional em estudos de clima espacial. O instituto atua no monitoramento, emissão de alertas e desenvolvimento de protocolos de mitigação em parceria com instituições internacionais.
Além disso, o país investe em projetos estratégicos, como o Galileo Solar Space Telescope (GSST) e a participação no satélite CBERS-5, que ampliam a capacidade brasileira de observação do Sol e de resposta a eventos extremos.
O Tempo de Aviso que a Ciência Pode Oferecer
Os efeitos de uma tempestade solar não chegam todos ao mesmo tempo. Segundo o pesquisador do INPE:
- Radiação eletromagnética atinge a Terra em cerca de 8 minutos, podendo causar apagões de rádio imediatamente;
- Partículas energéticas podem chegar em minutos ou poucas horas, oferecendo riscos à aviação e a satélites;
- Ejeções de massa coronal levam de 1 a 4 dias para alcançar o planeta, período em que é possível acionar protocolos de mitigação.
O grande desafio está em identificar sinais confiáveis antes da liberação abrupta de energia, processo associado à chamada reconexão magnética nos campos magnéticos solares.
Aumentando a Preocupação com o Risco Solar
O Sol caminha para uma fase de alta atividade dentro do atual ciclo solar, mas Vieira alerta que o Evento Carrington não ocorreu exatamente no pico do ciclo, e sim em sua fase descendente. Isso significa que eventos extremos podem ocorrer fora do máximo solar.
Por isso, o especialista defende que a principal preocupação não deve ser o pânico, mas sim o investimento contínuo em ciência, monitoramento e políticas públicas de mitigação.
“A cobrança deve ser por sistemas robustos de previsão e por protocolos capazes de reduzir impactos econômicos e sociais”, afirma.